
O Brasil é um país laico com milhões de pessoas praticando suas religiões de preferência e com que mais se identifica. Porém, nem sempre a espiritualidade é respeitada, fazendo com que episódios de intolerância religiosa aconteça de várias formas.
O termo “macumba”, muitas vezes usado de forma pejorativa para se referir às religiões de matriz africana como o Candomblé e a Umbanda, voltou ao centro do debate público nos últimos dias, impulsionado por três episódios de grande repercussão na mídia e nas redes sociais. A expressão, marcada por estigmas e preconceitos, foi mencionada em entrevistas, discursos religiosos e até em um programa ao vivo da TV Globo.
O primeiro episódio envolveu a apresentadora Marcia Goldschmidt, durante participação no programa No Alvo, do SBT. Questionada sobre uma antiga fofoca de rivalidade nos bastidores do programa Mulheres, ela reagiu com ironia ao ser lembrada de que o jornalista Leão Lobo teria afirmado que ela lhe fez “macumba”. “Foi internado na Psiquiatria?”, respondeu Marcia. “As pessoas que não têm relevância precisam criar delírios com o nome de quem tem relevância… Eu não faço macumba, eu faço audiência.” O boato, segundo a apresentadora, a persegue há mais de 20 anos. Caso semelhante envolveu a cantora Mara Maravilha, que já declarou nunca ter feito nenhum ritual espiritual contra colegas, como sugerido em antigos rumores envolvendo Angélica.
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Outro caso que gerou forte reação ocorreu durante uma missa na cidade de Areial, na Paraíba. O padre Danilo César de Sousa Bezerra foi denunciado por intolerância religiosa após zombar da fé de Preta Gil, que era adepta do Candomblé. “Cadê esses orixás que não ressuscitaram Preta Gil?”, questionou em tom debochado diante dos fiéis. A Diocese da região divulgou uma nota se comprometendo com a liberdade religiosa e repudiando qualquer forma de discriminação, enquanto o episódio reacendeu discussões sobre a intolerância enfrentada por praticantes das religiões afro-brasileiras no país.
Já a cantora Alcione divertiu o público ao fazer uma declaração durante o programa É de Casa, da Globo. Em tom descontraído, ela ironizou o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump: “Quando sair daqui vou fazer uma macumbinha pra Trump”, disse, arrancando risos dos presentes. Nas redes sociais, a fala gerou reações mistas — de elogios bem-humorados a críticas. Alcione é uma das artistas brasileiras que assumidamente seguem a Umbanda e o Candomblé, religiões que descobriu após transitar pelo catolicismo e espiritismo kardecista.
Os três casos recentes evidenciam como o termo “macumba” ainda é alvo de estigmatização e reforçam a necessidade de respeito à diversidade religiosa no Brasil. A banalização da palavra, usada muitas vezes como ofensa, revela não apenas ignorância, mas também o racismo religioso presente em parte significativa da sociedade.
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Religiões de matriz africana
As religiões de matriz africana, como o Candomblé e a Umbanda, têm raízes profundas na cultura afro-brasileira e foram fundamentais na preservação da identidade e espiritualidade dos povos africanos trazidos ao Brasil durante o período da escravidão. Ambas se baseiam na relação entre os seres humanos e as divindades conhecidas como orixás, que representam forças da natureza e aspectos da vida, como o amor, a justiça, a guerra e a fertilidade. Essas práticas foram adaptadas ao longo dos séculos, incorporando elementos do catolicismo e do espiritismo em resposta à perseguição e repressão religiosa que sofreram.
O Candomblé é uma religião iniciática e estruturada, com rituais específicos, hierarquia bem definida e forte vínculo com a ancestralidade. Seus ritos são realizados em terreiros, locais sagrados onde ocorrem oferendas, cantos e danças para os orixás, muitas vezes acompanhadas por atabaques e cânticos em línguas africanas como o iorubá. Cada praticante é associado a um orixá que guia sua vida, e o culto envolve uma relação espiritual direta, marcada por respeito, disciplina e aprendizado.
A Umbanda, por sua vez, é uma religião mais sincrética, que surgiu no início do século XX, no Rio de Janeiro, unindo elementos do Candomblé, do catolicismo popular, do espiritismo kardecista e de tradições indígenas. Suas práticas incluem passes energéticos, consultas com guias espirituais (como pretos-velhos, caboclos e crianças) e trabalhos voltados à caridade e à cura espiritual. A Umbanda busca a harmonia entre os mundos material e espiritual, promovendo o bem-estar coletivo e o desenvolvimento moral do indivíduo.
Apesar de suas contribuições culturais e espirituais, o Candomblé e a Umbanda ainda enfrentam forte intolerância religiosa no Brasil. O preconceito é alimentado por desinformação, racismo estrutural e campanhas de demonização promovidas por setores fundamentalistas. No entanto, essas religiões seguem resistindo e reafirmando sua importância na diversidade religiosa brasileira, com cada vez mais pessoas se engajando em sua valorização e defesa.
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