
Séculos antes de o debate sobre a autenticidade do Santo Sudário de Turim ganhar corpo com análises científicas modernas, um dos maiores intelectuais da França medieval já colocava em xeque a origem da relíquia.
Batizado Nicole Oresme, filósofo, cientista e conselheiro da realeza francesa, afirmou em escritos do século XIV que o pano era uma possível falsificação usada por membros da Igreja para atrair fiéis.
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A revelação consta de um estudo recente publicado no Journal of Medieval History, com base na obra Problemata, de Oresme. Embora amplamente estudado, esse texto teve trechos ignorados por séculos, inclusive a passagem que menciona diretamente o Sudário como exemplo de suposto milagre forjado.
A descoberta joga nova luz sobre um dos objetos religiosos mais controversos da história cristã: um pano de linho de 4,2 metros que traz a imagem de um homem crucificado e que muitos acreditam ter envolvido o corpo de Jesus Cristo.
Referência anterior às denúncias conhecidas
Até então, os registros mais antigos de contestação da autenticidade do Sudário datavam de 1389, quando o bispo Pierre d’Arcis escreveu ao papa afirmando que o pano teria sido criado por um artista. Oresme, no entanto, morreu em 1382, e seus escritos sobre o tema são, portanto, anteriores.
No Problemata, ele faz críticas genéricas à manipulação de relíquias, alertando que "muitos clérigos enganam outros" para obter benefícios financeiros. Ao citar uma igreja em Champagne, mesma região onde o Sudário teria surgido por volta de 1355, ele sugere que o pano já era alvo de ceticismo.
O achado foi identificado pelo historiador Nicolas Sarzeaud, da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica. Segundo ele, o texto de Oresme representa “um novo e valioso testemunho sobre a percepção do Sudário ainda no século XIV”.
Séculos de controvérsias e investigações
Guardado desde 1578 na Catedral de São João Batista, em Turim, na Itália, o Sudário foi submetido a testes de datação por radiocarbono em 1988, que situaram sua origem entre os anos 1260 e 1390, reforçando a tese de que se trata de uma criação medieval.
Além disso, o tipo de tecido e as técnicas utilizadas na confecção também apontam para uma data posterior à época de Cristo. Apesar disso, a relíquia ainda é alvo de estudos e crenças fervorosas. Para os que creem, trata-se de uma prova física da ressurreição. Para os céticos, um artefato construído para impressionar.
Em julho de 2025, por exemplo, um estudo brasileiro com modelagem 3D indicou que a imagem pode ter sido formada a partir de uma estátua e não de um corpo humano. A tese, porém, também foi alvo de contestação.
Um debate que resiste ao tempo
Para especialistas como a historiadora Cheryl White, da Louisiana State University, as novas descobertas reforçam que o ceticismo sobre o Sudário não é recente, mas fazem pouco para resolver o impasse: “O Sudário desafiou explicações por séculos. Pode nunca ser resolvido. É isso que o torna tão fascinante”, afirmou.
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Enquanto isso, estudiosos como Sarzeaud veem no texto de Oresme uma peça importante para entender como o objeto foi recebido em sua época, e como a fé, o ceticismo e a política eclesiástica já se entrelaçavam muito antes da ciência moderna entrar em cena. “Tudo e o oposto de tudo já foi dito sobre o Sudário. O desafio é separar evidência de desejo”, resume Sarzeaud.
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