
No segundo dia do julgamento da ação penal que apura uma suposta tentativa de golpe de Estado em 2022, a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) usou seu tempo na tribuna do Supremo Tribunal Federal (STF) para fazer duras críticas à condução do processo, especialmente à delação de Mauro Cid — ex-ajudante de ordens de Bolsonaro — e ao acesso às provas pela defesa.
A sessão desta quarta-feira (3) foi marcada pelas sustentações orais dos advogados de parte dos oito réus da ação, entre eles o ex-presidente. O julgamento é conduzido pela Primeira Turma do STF e é considerado um marco por envolver um ex-chefe do Executivo, generais da reserva e figuras centrais do governo anterior, além de tratar de acusações que colocam em xeque o respeito ao Estado Democrático de Direito.
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“Não há uma única prova”
O advogado Celso Vilardi, responsável pela defesa de Bolsonaro, abriu sua fala destacando a gravidade e o ineditismo do processo, mas sustentou que não há qualquer elemento concreto que vincule o ex-presidente à organização ou à execução de um golpe.
“Não há uma única prova que atrele o presidente a qualquer operação como Punhal Verde e Amarelo, Luneta, à minuta do golpe ou mesmo aos atos de 8 de janeiro”, afirmou.
Vilardi também destacou que nem mesmo Mauro Cid, cuja colaboração é considerada peça-chave pela acusação, teria apontado envolvimento direto de Bolsonaro nos episódios mais críticos.
Delação colocada em xeque
Boa parte da sustentação foi dedicada à crítica direta à delação premiada de Mauro Cid. O advogado apontou que o ex-ajudante de ordens teria prestado ao menos 16 depoimentos, alterando sua versão em diversas ocasiões, e que há contradições e omissões reconhecidas pela própria Polícia Federal e pelo Ministério Público.
Segundo Vilardi, essas inconsistências deveriam ser suficientes para invalidar toda a colaboração. “O colaborador mudou de versão inúmeras vezes. Isso não sou eu quem estou dizendo, está no relatório final da PF. Como confiar em um delator que revela informações para terceiros e admite que foi induzido?”, questionou.
O advogado se referiu também a uma suposta conta falsa de Instagram, vinculada ao delator, por meio da qual Cid teria conversado sobre os termos da delação antes mesmo de ela se tornar pública. Vilardi afirmou que a conta foi localizada no celular de Mauro Cid, com senha e e-mail pessoal do ex-ajudante de ordens, e com registro de localização no condomínio onde ele reside.
“Ele negou a existência do perfil, disse que era montagem. Mas os dados técnicos mostram que era dele. Isso compromete completamente sua credibilidade como colaborador”, disse o advogado.
“Delação que não existe em lugar nenhum do mundo”
Vilardi ainda argumentou que o Ministério Público estaria tentando sustentar uma delação “parcialmente falsa” e, mesmo assim, aproveitá-la para propor atenuação de pena ao delator — algo que, segundo ele, contraria a legislação brasileira e não encontra paralelo no direito internacional.
“Isso que está sendo feito aqui não é uma jabuticaba. É algo que não existe nem aqui, nem em lugar nenhum do mundo. Ou a delação é válida e consistente, ou ela é inválida. Não se pode usar trechos de um depoimento com omissões comprovadas para condenar alguém”, criticou.
Críticas ao acesso às provas
A defesa também levantou questionamentos sobre a condução processual, dizendo que teve dificuldades para acessar provas e documentos entregues pela Polícia Federal, o que teria dificultado a elaboração da defesa.
“Com todo o respeito, houve cerceamento de defesa. Muitas informações chegaram em cima da hora, sem tempo hábil para análise”, reclamou Vilardi. "Nós não tivemos o tempo que a Polícia Federal e o Ministério Público tiveram [para analisar as provas]. São bilhões de documentos. Eu não conheço a íntegra desse processo", declarou.
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