
A decisão de julgar o ex-presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF) não é aleatória — está fundamentada em uma interpretação constitucional que garante foro especial a autoridades por crimes cometidos durante o exercício de seus cargos. Mesmo fora da presidência, Bolsonaro é julgado na mais alta Corte do país porque os crimes dos quais é acusado — como tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e associação criminosa — teriam sido cometidos enquanto ele ainda ocupava o cargo de presidente da República.
De acordo com decisão recente do próprio STF, tomada em março de 2024, o foro por prerrogativa de função continua válido mesmo após o fim do mandato, desde que os atos investigados tenham ocorrido durante o exercício do cargo. Esse entendimento foi crucial para manter Bolsonaro sob a jurisdição do Supremo, em vez de enviar seu processo para a primeira instância da Justiça comum.
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Isso difere do caso do presidente Lula, por exemplo, que foi julgado inicialmente por um juiz de primeira instância porque os crimes que lhe foram atribuídos teriam ocorrido fora do período em que ele estava no cargo. Só depois o caso subiu às instâncias superiores — e acabou sendo anulado pelo STF por questões de competência e imparcialidade do juiz Sérgio Moro.
A Constituição brasileira determina que cabe ao STF julgar crimes comuns cometidos pelo presidente da República durante o mandato. Por isso, a competência do Supremo se mantém mesmo após a saída do cargo, se os fatos forem relacionados ao exercício da função. Essa regra visa evitar que autoridades sejam alvos de perseguição política ou decisões judiciais conflitantes em tribunais inferiores.
Ainda assim, há controvérsia sobre onde exatamente, dentro do STF, o julgamento deveria ocorrer. O processo de Bolsonaro está sendo analisado pela Primeira Turma da Corte, composta por cinco ministros. A defesa do ex-presidente contesta essa decisão e defende que o julgamento ocorra no Plenário, com a participação dos 11 ministros, argumentando que se trata de um caso de alta relevância institucional.
Juristas divergem sobre a escolha da Turma. Alguns afirmam que o regimento do STF reserva ao Plenário os julgamentos de presidentes da República, ainda que já tenham deixado o cargo. Outros defendem que, como Bolsonaro é ex-presidente, a competência pode ser da Turma, especialmente por conexão com os demais processos do 8 de janeiro, que já estão sendo julgados nesse colegiado.
A escolha da Primeira Turma também gerou críticas de apoiadores de Bolsonaro, que acusam desequilíbrio político no grupo de ministros que compõe o colegiado. Dos cinco, quatro foram indicados por governos petistas. Os dois ministros indicados por Bolsonaro, Nunes Marques e André Mendonça, fazem parte da Segunda Turma e não participarão da votação — o que, segundo a defesa, prejudicaria a imparcialidade do julgamento.
Caso seja condenado, Bolsonaro terá opções de defesa bastante limitadas. Como está sendo julgado diretamente na última instância do Judiciário, ele não poderá recorrer a tribunais superiores como aconteceu no caso de Lula. A única possibilidade de novo julgamento seria se houver ao menos dois votos pela absolvição — o que permitiria à defesa entrar com embargos infringentes e levar o caso ao Plenário do STF.
Portanto, o julgamento de Bolsonaro no STF é resultado direto da combinação entre os fatos investigados (ocorridos no mandato) e o entendimento atual da Corte sobre o foro por prerrogativa de função. O debate, no entanto, permanece aberto sobre os limites desse foro e os riscos de politização dentro da própria estrutura do Supremo.
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