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PAPO DE PAI

Homens usam a internet para falar sobre experiências e relações de afeto com filhos

O advogado e escritor Fernando Gurjão Sampaio tem cinco filhos - a mais velha tem 19 anos e está na faculdade; o mais novo tem 1 ano e está aprendendo suas primeiras palavras. O jornalista Marcos Piangers tem duas meninas, a Anita e a Aurora, de 15 e oito

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Imagem ilustrativa da notícia Homens usam a internet para falar sobre experiências e relações de afeto com filhos camera Divulgação

O advogado e escritor Fernando Gurjão Sampaio tem cinco filhos - a mais velha tem 19 anos e está na faculdade; o mais novo tem 1 ano e está aprendendo suas primeiras palavras. O jornalista Marcos Piangers tem duas meninas, a Anita e a Aurora, de 15 e oito anos, respectivamente, cada uma com uma personalidade bem distinta. Em comum, Fernando e Marcos descobriram que paternidade é para ser bem vivida e compartilhada, tornando-se referência para outros homens e mostrando que o Dia dos Pais é para ser vivido não só no segundo domingo de agosto, mas em todos os outros 364 dias do ano.

“Começou de forma muito natural, eu sou de uma geração que pegou o início da internet e das redes sociais. Postar sobre filhos, o meu dia a dia com com eles, não foi algo planejado, apenas uma retrato simples do cotidiano. Só que isso começou a tomar outro caráter quando as pessoas começaram a me ver como um exemplo - o que eu nunca pensei que ocorreria”, diz Fernando, que hoje tem uma grande audiência no Twitter, com mais de 97 mil seguidores, e escreve para o site “Papo de Pai”.

Maria Fernanda, a filha mais velha, nasceu quando ele tinha 22 anos. “Obviamente, eu não pensava em ter filhos com 22, então não foi uma coisa planejada, mas quando soube que ela viria, meu desejo sempre foi de dedicação a ela. Foi em um momento que eu cursava Economia e Direito, e decidi que iria focar em um, para me dar melhores condições de criá-la. Logo consegui estágio, com um salário que era todo para comprar fralda, e era um orgulho para mim sair com todas aquelas fraldas da farmácia”, lembra.

Ele avalia que um pouco do seu conforto neste papel e do que imaginava que seria um bom pai veio da sua própria família. “Meus pais sempre foram muito dedicados, presentes. Óbvio que histórico familiar não cria um pai, essa é uma construção muito individual. Mas, no meu caso, foi um exemplo que ajudou muito. A própria atitude deles quando souberam da Maria Fernanda foi importante. Meu pai se levantou e me deu um abraço”, conta. Mas Fernando também acredita que, mesmo quem não teve um pai para se espelhar, pode aprender.

Esse foi o caso de Piangers. O jornalista conta que desde quando Anita nasceu teve uma relação muito próxima e participativa, e que isso pode ter relação com o fato de ele próprio não ter tido pai. Ter uma rotina com a filha e aprender com ela, no entanto, tornou-se logo algo solitário dentro de uma cultura do machismo, que não parecia permitir ao pai expor seu lado carinhoso, afetuoso e participativo aos amigos. O que o levou a registrar isso em textos que ficaram longe dos olhos do público por 10 anos, antes de uma amiga ler e o incentivar a publicar em um jornal. Histórias divertidas e emocionantes, elas ainda viraram livro.

“Por isso este é um dia de celebração do pai que a gente é e do pai que a gente pode ser. O Dia dos Pais não faz ninguém pai. Mesmo o nascimento de um filho não faz do pai biológico um pai de fato. A gente vira pai no dia a dia, trocando fralda, virando a noite, participando, demonstrando afeto, se permitindo transformar num homem melhor”, diz ele.

Conto de fadas da vida real

Homens usam a internet para falar sobre experiências e relações de afeto com filhos
📷 |Divulgação

Tanto Marcos Piangers, que hoje soma mais de 5 milhões de seguidores nas redes sociais, como Fernando Gurjão Sampaio dizem que é sempre muito bom o contato com outros pais. E a internet cada vez mais os conecta. “São homens que dizem coisas como ‘quando for pai, quero ser assim’, ‘quero fazer isso com meus filhos’. E é legal que você consiga influenciar outros homens para que percebam a importância da paternidade, que não é ajudar, e sim participar. Isso é muito gratificante”, diz Fernando.

Na percepção dele, as mulheres são as que compartilham maiores dificuldades diante da ausência do pai. E também há muitos relatos de distanciamento quando se trata da relação de pais com filhas mulheres. Prova disso é que, há alguns meses, um dos seus textos mais lidos falava justamente de sua abertura para dialogar com a filha sobre sexualidade. “Eu falava sobre a necessidade de acolhimento, da conversa, da compreensão e fiquei chocado com a quantidade de meninas que convivem com uma espécie de repreensão”, diz.

Outro cenário que o preocupa é o dos pais que se afastam dos filhos quando o relacionamento com mãe deles termina. Com cinco filhos, gerados com quatro mulheres diferentes, Fernando conta que houve um tempo em que cada um morava em uma cidade - Maria Fernanda em Ananindeua; Carlos Henrique, 12, em Macapá; Letícia, 7, em Florianópolis; e apenas Iris, 4, e Vicente, 1, viviam com ele e a esposa, Lívia, em Belém. E quem disse que essa distância geográfica se tornou um obstáculo para ele?

“Acho legal quem tem uma história de contos de fadas em relação à paternidade, mas também vejo pai desistindo porque não conseguiu viver a história que ele sonhou. Eu fui um pai equilibrista, de dois em dois meses eu ia ver a Letícia em Florianópolis. É legal relatar que você consegue ser um bom pai, não importa a história que você tenha. Seja se a mãe do seu filho hoje é uma das suas melhores amigas, como é mãe do Carlos; ou se você enfrenta alienação parental, como eu sofri a resistência para que eu participasse da vida da minha filha, e mesmo assim lutei e consegui ser pai”, aponta.

EXPERIÊNCIA

Há sete anos casado com Lívia, Fernando relata o quão sua experiência acabou trazendo conforto para a então mamãe de primeira viagem. “Foi até engraçado ver isso, porque eu era o experiente, a sogra tateava e a Lívia também sobre como trocar fralda, como dar banho... Eu era o que chegava e dizia: ‘deixa que eu faço’”, conta com bom humor.

Piangers destaca outras pressões e estereótipos que prejudicam essa relação entre pais e filhos, como o fato de alguns homens ainda se verem como provedores da casa a ponto de achar que seu papel é pagar as contas e substituir suas ausências com algum presente. Ele lembra quando, em 2016, trabalhando na TV Globo com a Fátima Bernardes, cobrindo Olimpíadas e viajando o país todo lançando seu segundo livro (”Meu Pai é Pop 2”), entre outros compromissos profissionais, Anita puxou a camisa do pai e disse que ele estava trabalhando demais.

“E falei: ‘Por que filha? Eu estou no auge da minha carreira, tô bombando’. E ela olhou e disse: ‘mas isso não faz diferença nenhuma pra gente, você precisa equilibrar a sua vida profissional, porque não adianta nada você trabalhar e não ver a gente crescer’. A minha filha pequena, na época com 11 anos, me disse isso. Ninguém é grande demais que não possa aprender, e ninguém é pequeno demais que não possa ensinar”, lembra Piangers, que reorganizou toda a sua vida para ter mais tempo com as duas.

Além de pedir demissão de vários trabalhos e se dedicar a atividades em casa, mudou de cidade para estar perto da família da esposa e ter pequenos prazeres cotidianos, como levar as pequenas a pé todos os dias para a escola. “Nesse trajeto eu posso conversar, ouvir e aprender. Eu redesenhei toda a minha vida, isso é uma coisa que eu aprendi com a paternidade. No último dia de vida, a gente não se arrepende assim: ‘ah, devia ter trabalhado mais’, ‘devia ter preenchido mais relatório’, ‘ah, meus filhos provavelmente queriam mesmo que eu tivesse um carro maior’”, diz ele.

Com Aurora ele aprendeu ainda muitas outras coisas, entre elas que os unicórnios vivem no arco-íris, que a fada do dente sempre aparece quando surge uma janelinha e que as princesas existem. “Vocês tem muito que aprender comigo, papai!’”, disse certa vez.

O jornalista guardou isso em um texto porque achou muito profundo e uma lição aos adultos, que costumam achar que sabem de tudo porque construíram uma família, uma carreira, uma casa. Mas nesse processo se esquecem que um dia já foram crianças. “Com o passar do tempo, a gente vai acreditando que não existem fadas do dente, unicórnios, princesas, esse é um processo que vai nos desencantando. E vem uma criança para nossa vida e diz: ‘olha como dá para vida ser encantada’, ‘olha como dá para acreditar naquilo que você queria ser, aquele super-herói gentil, honesto e humano’”. Como todo pai deveria ser.

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