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DAQUI TE ESCREVO

Glória Maria e a excelência negra no Jornalismo brasileiro 

A coluna Daqui te Escrevo, escrita pelo jornalista Anderson Araújo, volta ao ar com homenagem à jornalista Glória Maria, falecida na quinta-feira (02).

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Imagem ilustrativa da notícia Glória Maria e a excelência negra no Jornalismo brasileiro  camera Glória Maria: uma vida invejável de excelência profissional e lições sobre viver. | Reprodução

Antes do rap brasileiro popularizar que preto e dinheiro podiam sim estar na mesma frase, como afronta a um sistema racista que exclui a população negra de tudo, Glória Maria surgiu na televisão como um símbolo representativo de outra alternativa para mulheres pretas, que não a pobreza. Apareceu na maior emissora do país com sua pele reluzente, seus cabelos crespos e uma voz inesquecível, junto a uma forma de falar e contar histórias que atraia quem quer que fosse para prestar atenção no que ela dizia.

Glória ganhou grande destaque no início da carreira se tornando personagem e, ao mesmo tempo, repórter de uma denúncia de racismo contra ela mesma, na década de 80. A partir daí se tornou sinônimo de excelência negra no Jornalismo e conquistou o Brasil, embora já estivesse na tevê há muito tempo, desde o estágio no programa do Chacrinha, outro ícone da comunicação popular televisiva.

A coluna Daqui te escrevo retorna com homenagem à querida Glória.
📷 A coluna Daqui te escrevo retorna com homenagem à querida Glória. |Arte: Emerson coe e Thiago Sarame

Mesmo numa Globo, que sempre mal dimensionou a representativa negra brasileira e até reforçou estereótipos negativos em suas novelas e humorísticos, Glória Maria conseguiu impor sua marca. Transformou-se em um símbolo poderoso e foi antirrascista sendo o que era: uma jornalista das grandes, uma mulher impossível de se ignorar, uma cabeça ativa e, principalmente, uma pessoa que viveu, viveu bem na frente e por trás das câmeras.

Viveu tanto e bem que, em torno dela, criou-se um mistério sobre a idade biológica. Glória poderia ter 30 ou 90 anos, poderia ter a idade do céu. O que importa? Viver ou morrer é o de menos (“a vida pode ser a qualquer momento”). O que vale não sair do nosso foco é a experiência, a presença e a vontade. Glória partiu aos 73 anos, revelaram todos os jornais, mas comeu o mundo inteiro a colheradas, sem medo, com um desejo vivo, que deixou impresso nas suas declarações em vida. “Ninguém vai morrer no meu lugar”, ela disse, em uma entrevista relativamente recente, em uma defesa apaixonada não da vida, esse substantivo insosso, mas de viver - verbo poderoso no qual tudo cabe e dá sentido à existência.

Num país em que pretos e pardos são subestimados intelectualmente o tempo todo, ter a Glória Maria como símbolo de inteligência e comunicação bem feita foi uma luz, principalmente, por ela ter feito isso no espaço em que fez e também da forma que fez. Não raro alguém assumia a inveja pela vida gloriosa (sem trocadilhos) que Glória teve. Imagina conhecer mais de 100 países para fazer o que mais gostava na vida: narrar história de um modo todo próprio e ainda ser bem pago por isso. Nós, meros mortais em nossos empregos medianos, suando pela sobrevivência, olhávamos aquela mulher elegante na TV com uma admiração imensa, do tamanho que ela era.

A partida de Glória me lembrou outra grande mulher negra, Helaine Martins, jornalista e minha amiga que se foi em 2021, cedo demais, com apenas 40 anos. Antes de partir, criou o movimento "Entreviste um negro", pra mostrar que estamos na mídia não apenas de forma negativa. São duas mulheres, pretas e fodas, que trabalharam para vencer rótulos, para rasgar o véu nojento que o racismo nos impõe desde que o Brasil é Brasil. Cada uma delas lutou o bom combate em suas trincheiras, cada uma delas contribuiu da sua forma particular para pôr esse trabalho infinito de guerrear contra essa infame marca história do nosso País.

Nunca perguntei – e posso estar enganado -, mas creio ardentemente que Helaine era fã de Glória e, caso se encontrassem, passariam horas e horas conversando e falando de suas vidas como mulheres negras e jornalistas excelentes que foram. Antes de morrer, Helaine me contou orgulhosa que foi à Globo dar uma palestra sobre seu projeto para jornalistas. Será que se viram essas duas mulheres? Quero pensar que sim, que respiraram a mesma a atmosfera pelo menos de longe.

Glória Maria se foi e ficamos aqui sem acreditar. Como pode alguém desse qualidade partir? A morte deveria abrir exceções, de vez em quando ou dar mais tempo aos que se tornam, em vida, símbolos e exemplos de que podemos fazer e ser um pouco melhores.

Que venham outras Glórias e mais Helaines. Nós precisamos. O Brasil precisa. Muito. Já. Sempre. Todos os dias.

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