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SEGURANÇA

Amazônia Legal: aumento de 219% em novas armas registradas

Segundo instituto, regras mais brandas para certificação de armamentos desde 2018 e os conflitos já históricos na região são um barril de pólvora para atos de violência, como o que vitimou indigenista e jornalista

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Imagem ilustrativa da notícia Amazônia Legal: aumento de 219% em novas armas registradas camera Facilidades criadas pelo governo federal ampliou acesso às armas e registros para caçadores e colecionadores | Divulgação

Em três anos, os pedidos de registro de novas armas de fogo aumentaram 219% na Amazônia Legal. A região é formada por nove estados, entre eles o Pará. São 772 municípios em um território de mais de cinco milhões de metros quadrados, o que corresponde a 58,9% do território brasileiro. O levantamento feito pelo Instituto Igarapé mostra que, enquanto o número de homicídios caiu em todo o Brasil, na região houve um aumento de 2%, passando de 8.936 em 2012 para 9.084 em 2020. As mortes por arma de fogo na Amazônia Legal cresceram 4% entre 2012 e 2020, passou de 5.537 para 5.780, enquanto no Brasil, houve queda de 15% no mesmo período, de 40.071 para 33.993 mortes.

Os números divulgados na terceira edição do boletim “Descontrole no Alvo”, publicado pelo Instituto Igarapé mostra que entre 2018 e 2021, em todo o Brasil houve o crescimento de 130,4% no número de novos registros de armas de fogo por pessoas físicas, contra o aumento de 219% na Amazônia Legal. Em 2018 eram 57.737 armas registradas. Em 2021 esse número chegou a 184.181. O estudo aponta que as facilidades criadas pelo governo federal na política de acesso à armas ampliou em 130% as licenças para pessoas físicas no país.

É na área da Amazônia Legal que une os estados do Pará, Amapá e parte do Maranhão que se concentra o maior aumento de registro de novas armas, que chegou a 261,9%. Eram 9.690 armas em mãos de pessoas físicas em 2018 e hoje são quase 36 mil somente nesses três estados, onde são históricos conflitos por posse de terra ou por exploração ilegal de madeira e do garimpo.

De acordo com o boletim, chama a atenção o aumento expressivo de armas registradas por Caçadores, Atiradores e Colecionadores, os CACs, na região, que desde 2018 foi de quase 300%. “Especialmente preocupante é o crescimento de registros na 12 Região Militar, que abrange os Estados do Amazonas, Acre, Roraima e Rondônia, e que superou os 450% no período. Com menos limitações nestes casos, os CACs podem constituir um verdadeiro arsenal”, alerta o Instituto Igarapé.

Com menos limitações nestes casos, os CACs podem constituir um verdadeiro arsenal. Atiradores esportivos podem possuir até 60 armas, sendo 30 de uso restrito, como os fuzis semiautomáticos, e os caçadores esportivos tem um limite de até 30 armas, sendo 15 de uso restrito.

A caça é proibida no Brasil. A exceção é o javali, animal com pouca presença na região amazônica. O relatório sobre “áreas prioritárias para o manejo de javalis”, publicado pelo Ibama em 2019, que estabelece as localidades no Brasil onde há grande incidência de javalis, animal que atrai a atenção dos caçadores, os CACs, mostra que os javalis são encontrados em 1.536 municípios do Brasil. Destes, apenas 125 estavam na Amazônia Legal, sendo somente sete deles no Pará, com mais concentração de animais em Concórdia do Pará; Acre (4 municípios), Amazonas (7), Maranhão (21), Mato Grosso (51), Rondônia (15) e Tocantins (20).

Foi na região destacada pelo Instituto Igarapé que aconteceu um dos mais violentos crimes cometidos por motivações ligadas à defesa do meio ambiente e das populações originárias: O assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Philips, mortos em junho por homens acusados de envolvimento com a pesca ilegal na floresta no Vale do Javari. O crime chamou a atenção do mundo para a violência no Norte do Brasil.

“A constatação é um alerta importante. É fundamental que os órgãos de segurança pública da Amazônia Legal avancem em suas capacidades de rastreamento sistemático das armas apreendidas usadas em crimes para identificar sua origem”, analisou Melina Risso, diretora de pesquisas do Instituto Igarapé. Para Melina Risso, na região há um ambiente propício ao conflito.

PERIGO

No dia 17 deste mês, uma reportagem produzida pelo jornal O Globo alertava para o perigo do aumento no número de armas em circulação no país. Segundo o texto, três anos após a flexibilização, o Brasil chegou ao número de 46 milhões de permissões para compra de armas por civis, concedidas a caçadores e atiradores.

“Este é o total de armas que, após mudanças recentes na legislação, podem ser adquiridas por membros dessas categorias, que também tiveram crescimento de pessoas registradas. O cenário revela que hoje há 605,3 mil pessoas — se incluídos também os colecionadores —, que têm carteirinhas ativas para acesso a armamento, inclusive pesado, e munição”, revela o jornal.

Segundo a apuração do jornal, isso é mais do que o total do efetivo de policiais militares em ação no país, que hoje chega a 406,3 mil agentes, ou de militares das Forças Armadas em serviço, que somam 357 mil pessoas.

“O contingente total de CACs — caçadores, atiradores e colecionadores — triplicou desde 2019. Com isso, hoje já são 1,25 milhão de registros ativos. O número supera o de pessoas autorizadas a ter arma porque cada integrante das três categorias pode ter um registro sobreposto. Ou seja, um caçador também pode ser atirador ou colecionador, por exemplo”, revela o texto.

Desde 2019, o Instituto Igarapé vem acompanhando com preocupação a facilitação do acesso e da ampliação das armas de fogo e munições em circulação no país, decorrentes de uma série de alterações realizadas pelo governo federal. O acesso a fuzis passou a ser permitido para caçadores e atiradores esportivos, e cidadãos passaram a poder comprar armas que antes eram restritas ao uso das forças policiais, como as pistolas 9mm. “O resultado foi a adição de quase um milhão de armas às mãos de pessoas físicas em três anos - o mesmo número de armas retiradas de circulação em dez anos de campanhas de entrega voluntária de armas. Tal facilitação não foi acompanhada pelo fortalecimento dos controles estatais para evitar os desvios desses arsenais para a ilegalidade”, revela o Instituto.

“Os impactos da ampliação do acesso a armas e munições na Amazônia Legal, o aumento da circulação legal destes instrumentos na região em ritmo ainda maior do que no restante do país é muito preocupante”, ressalta o relatório sobre as armas.

“No complexo ecossistema de crimes e ilegalidades, essa constatação é um alerta importante. A reversão da escalada de violência na Amazônia Legal exige uma concentração de respostas e atores. As evidências científicas produzidas no Brasil e no mundo indicam que o aumento das armas e munições em circulação poderão agravar ainda mais as dinâmicas de diferentes formas de criminalidade na região”, informa o Instituto.

O Instituto Igarapé é uma instituição brasileira baseada no conceito “think tanks”, que desempenha um papel de “advocacy” para políticas públicas. Voltado para as áreas de segurança pública, clima e ambiente e digital, o Instituto mantém parcerias e projetos em mais de 20 países.

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