Um novo olhar após a alta do Hospital de Campanha

O sino instalado próximo ao portão principal do Hangar Centro de Convenções, onde está montado o Hospital de Campanha em Belém, é tocado toda vez que um paciente de Covid-19 recebe alta médica e pode voltar para casa. O soar dele é seguido por palmas e gritos de alegria dos familiares que aguardam do lado de fora. Ansiedade, euforia e emoção se juntam ao sentimento de gratidão e transformam a atmosfera do lugar.

É na perspectiva de que a vida ganha novo sentido que homens e mulheres têm deixado o Hospital de Campanha. “Muda tudo! Muda sim, A partir de agora será ‘egoísmo zero’. Ninguém leva nada dessa vida”, disse Helena Martins, 66 anos.

Ela recebeu alta ontem (31), no final da tarde, no momento em que um grupo de religiosos fazia uma oração em frente a unidade para pedir pela saúde dos pacientes. Helena ganhou uma oração particular e ficou no centro de uma corrente. Emocionada, ela glorificou aos céus e deixou o Hangar afirmando que fará de tudo para ser uma pessoa melhor.

O cozinheiro Paulo Roberto Cardoso, 38, também deixou a unidade prometendo viver de uma forma melhor a partir de agora. “Muda tudo. Nossa! Principalmente depois de tudo o que eu vi e vivi aí dentro, sem dúvidas Deus me deu uma chance única que não vou desperdiçar sendo uma pessoa ruim, pelo contrário, quero ser sempre mais justo e melhorar a cada dia”, disse.

“A gente nunca pensa que vai acontecer com a gente”, comentou, se referindo ao fato de ter sido infectado pelo coronavírus e por ter visto “a morte tão de perto”. “Foi uma luta muito grande. Tudo aconteceu muito rápido”, descreveu. “Quero chegar em casa, me ajoelhar e agradecer a nova vida que ganhei”, completou Paulo Roberto. A noiva de Paulo, Mariza Nunes, foi quem o acompanhou nessa saga para vencer a Covid-19. “Foi muito difícil. Tiveram momentos que pensei que ele não fosse resistir. Agora volta para casa e vamos, sim, agradecer por esta vitória de vencer o vírus”, destacou.

O motorista José Welver da Silva, 47, foi um dos que tiveram alta ontem. Foi recebido com festa pela família. Balões brancos foram usados para simbolizar a saúde e o desejo de novos tempos para todos. Ainda enfraquecido pela doença, falava pouco e com a voz baixa. As lágrimas de emoção eram a resposta para cada pergunta sobre o que estava sentindo.

O irmão dele, José Wellington, foi quem resumiu parte da trajetória do motorista. “A evolução rápida da doença foi um grande susto para todos nós, porque ele vinha fazendo o tratamento em casa e de uma hora para outra precisou ser intubado”, comentou Wellington sobre como o coronavírus acometeu o irmão.

“Foram sete dias difíceis porque só era possível falar com ele uma vez por dia e por videochamada. A gente mora no mesmo prédio, eu via o meu irmão todos os dias e de repente não estava mais vendo ele ali, fisicamente, apenas por uma tela no celular. Tive medo, mas fomos regidos pela fé”, prosseguiu.

Também foi a fé que guiou o rodoviário José Rodrigues, 61, na luta contra o coronavírus. Ele é de Moju, nordeste paraense, e passou 12 dias internado no Hospital de Campanha em Belém. “Eu estou nascendo, de novo, para a vida. Por vários momentos tive medo, pensei que não venceria a doença”, disse ao deixar a unidade na tarde de ontem.

Familiares aguardavam e quando a porta abriu para ele sair eles ergueram as mãos, rezaram e agradeceram por José estar voltando para casa. “É uma alegria imensa. Posso dizer que vencemos juntos, todos nós, porque somos de outra cidade. Era difícil vir todos os dias, saber notícias. Estávamos em desespero”, comentou Iranilda Souza, que é considerada quase uma nora para José. Eles seguiram viagem ontem mesmo para Moju.