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DESAFIO COMUM

Estudantes de baixa renda relatam a dificuldades em estudar em casa e sem recursos

Estudantes de baixa renda relatam a situação difícil de estudar em casa sem acesso à bibliotecas, internet de qualidade, computador e outras facilidades oferecidas até antes da chegada do novo coronavírus

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Imagem ilustrativa da notícia Estudantes de baixa renda relatam a dificuldades em estudar em casa e sem recursos camera Ingrid Louzeiro tenta manter a pesquisa de mestrado com objetos que ganhou. | Irene Almeida

No momento em que as atividades presenciais do mestrado em educação foram suspensas em decorrência da pandemia do novo coronavírus, o que mudou para a pedagoga Ingrid Louzeiro, 26 anos, não foi apenas a rotina de aulas, mas também toda a estrutura que ela utilizava na universidade para dar andamento à pesquisa. De uma hora para outra, ela se viu diante da necessidade de encontrar, dentro de casa, as condições mínimas para conseguir prosseguir com a pesquisa, já que a data da qualificação segue a mesma, dezembro de 2020.

Dentre os impasses enfrentados pela jovem está uma realidade que não é apenas dela, mas de milhões de brasileiros. “Eu não tinha internet em casa. Tem um mês que eu consegui colocar uma internet que é compartilhada com um vizinho”, explica, ao pontuar como o início da pandemia foi difícil. “Quando tudo ainda estava normal parecia outro mundo. A forma de estudar era outra, a forma de fazer pesquisa também era outra porque eu me organizava 100% na UFPA (Universidade Federal do Pará). Lá eu tinha acesso aos computadores com internet, eu estudava na biblioteca, almoçava no RU (Restaurante Universitário) por R$1, então eu passava o dia todo lá e conseguia manter um bom ritmo”, lembra.

“Tudo que eu tenho de estrutura para estudar hoje são coisas que eu ganhei durante a pandemia. O quadro em que eu anoto o andamento da pesquisa, a mesa que eu estudo, o ventilador. O computador eu tive que emprestar”, enumera, ao apontar que, após essa organização, a rotina de estudos mantida em casa ficou mais equilibrada”.

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Com a internet instalada há cerca de um mês em casa, a mestranda teve a possibilidade de acompanhar com mais calma as atividades do grupo de pesquisa e sessões de estudo on-line. Apesar disso, ela sabe que, infelizmente, ainda são muitos os estudantes que não dispõem de tal estrutura, a começar ali mesmo no bairro onde mora, a Terra Firme. “A maioria das casas no bairro não tem computador”, considera. “A minha pesquisa é sobre educação popular, então o meu bairro também é o meu campo de pesquisa”.

ENEM

Se as mudanças impostas pela pandemia afetam quem já está no ensino superior, imagina quem se prepara para garantir uma vaga na graduação? Menos de seis meses separam os candidatos inscritos da primeira prova impressa do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), agendada para o dia 17 de janeiro de 2021. Ainda assim, não são poucos os estudantes que enfrentam grandes desafios no cenário de estudos em casa.

Também moradora da Terra Firme, a jovem Lana Gabrielle, 24 anos, utilizava a estrutura da biblioteca da UFPA, localizada no bairro, para se preparar para o exame que dá acesso ao ensino superior na grande maioria das universidades do país. Porém, desde o início da pandemia no Estado, que suspendeu as atividades presenciais em todas as instituições de ensino, ela também precisou encontrar meios de viabilizar os estudos em casa. “Na biblioteca eu estudava com o meu irmão ou sozinha e conseguia ter uma concentração maior”, lembra. “Em casa moram duas crianças de 2 e 10 anos (seus primos), então fica muito mais difícil se concentrar”.

 Lana Gabrielle tenta estudar pelo celular em casa.
📷 Lana Gabrielle tenta estudar pelo celular em casa. |Irene Almeida

Em busca de um momento mais tranquilo, Lana conta que durante algum tempo tentou estudar na madrugada. Porém, outras dificuldades surgiram. “Comecei a sentir dificuldade de me concentrar porque comecei a sentir muita ansiedade, preocupação com o Enem”.

Assim como no caso de Ingrid, a dificuldade de acesso à internet também foi uma realidade para Lana. A instalação de uma conexão Wifi em casa foi conquistada recentemente. Apesar do novo recurso, o computador da jovem quebrou e, agora, ela dispõe apenas do celular para estudar para o exame. “Vem a ansiedade na hora de estudar, mas eu também sigo confiante. Eu me coloco para cima”.

Preparação para o Enem está mais complicada

Plano em risco

As expectativas a respeito de como seria o último ano do ensino médio para a estudante Eduarda Cardoso, 17 anos, foram completamente modificadas pela pandemia. Também em preparação para o Enem, ela viu a rotina de estudos ser completamente alterada com a suspensão das aulas presenciais. “A situação ficou bem difícil por não ter tanto acesso à internet. A maior parte dos meus colegas que estudam na minha escola não tem tanto acesso à internet”, aponta a estudante do Colégio Estadual Paes de Carvalho (CEPC). “A maioria acessa pelo celular, que tem no máximo 2 a 4 gigas”.

Eduarda conta que, até o início da semana passada, ela própria só contava com a internet disponível no celular. Porém, a baixa qualidade da conexão e o rápido esgotamento da franquia lhe levaram a instalar internet em casa. “Antes disso, tentei manter a rotina de estudo exercitando principalmente redação, história, biologia, mas estava sendo bem difícil. Agora espero que melhore um pouco”, diz a estudante, que pretende cursar faculdade de Letras ou de Medicina. “Mas no momento eu também penso bastante nos meus colegas que não têm acesso a isso. Todo mundo está muito desmotivado para fazer a prova em janeiro. Todo mundo tinha uma visão de como ia ser o terceiro ano e foi tudo completamente diferente”.

Eduarda Cardoso defende o adiamento do Enem.
📷 Eduarda Cardoso defende o adiamento do Enem. |Divulgação

ADIAMENTO

Diante da dificuldade enfrentada por tantos jovens em diferentes escolas e bairros de Belém, Eduarda acredita que a melhor solução seria adiar o Enem, já que muitas famílias não se sentem seguras de enviar os filhos para o colégio antes da chegada de uma vacina contra o coronavírus. “Acho que o ideal seria adiar. Teve a votação para decidir a nova data e eu votei para maio, assim como muitos dos meus amigos, mas acabou ficando para janeiro”, lamenta. “Acho que deveria ser adiado até o fim da pandemia, no meio do ano que vem. Não ficaríamos tão nervosos de estar acabando o ensino médio e não estar conseguindo estudar”.

Considerando que as realidades vivenciadas pelos estudantes que se preparam para o Enem podem ser muito diferentes, Leonardo Vinícius Maciel, 18 anos, acredita que uma boa estratégia seria agendar a realização da prova do Enem. “O ideal seria contabilizar o período que nós ficaremos sem aulas e, quando nós retornarmos, nós teríamos que acrescentar esse período. Se ficarmos 150 dias parados, contamos 150 dias de aulas após o retorno para, somente assim, o exame ser aplicado”.

Leonardo Vinícius admite que o Ensino à Distância não tem a mesma eficácia do presencial
📷 Leonardo Vinícius admite que o Ensino à Distância não tem a mesma eficácia do presencial |Divulgação

De qualquer modo, ele reforça que, antes que isso ocorra, é preciso ter condições sanitárias mínimas. “Precisamos ter condições para voltar às aulas porque não podemos nos expor a risco”, preocupa-se.

No caso de Leonardo, a rotina de estudos mantida desde o início da pandemia tem sido um pouco mais tranquila porque, além de estudar no Colégio Paes de Carvalho, ele conquistou uma bolsa de estudos em um cursinho particular. Ainda assim, ele acredita que nada substitui a preparação presencial. “O ensino à distância nunca vai ser a mesma coisa”.

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