Uma multidão de afegãos tentaram embarcar em aviões que deixavam o aeroporto de Cabul. Vídeos mostram pessoas tentando subir em aeronaves em movimento, prestes a decolar, para tentar deixar o país. Muitos no país temem que o novo governo Taleban retome políticas fundamentalistas, como a proibição de que mulheres possam estudar e trabalhar fora de casa.
Em uma tentativa de passar uma imagem de moderação, Suhail Shaheen, porta-voz do Taleban, escreveu em uma rede social que o grupo tem ordem para não atacar a população. "A vida, a propriedade e a honra não podem ser feridas e deverão ser protegidas pelos mujahedins [guerrilheiros islâmicos]", afirmou.
O presidente Joe Biden estava em silêncio desde sábado (14), quando reafirmou sua decisão pela retirada, em um comunicado. No domingo (15), a Casa Branca divulgou uma imagem dele em uma reunião virtual em Camp David, casa de campo presidencial, para tratar da questão.
O democrata deveria tirar alguns dias de férias, mas retornou nesta segunda, depois que as cenas de caos no Afeganistão em meio à tomada de poder pelo Taleban geraram críticas ao governo americano, pela falta de planejamento na retirada.
No domingo (15), Biden foi atacado por republicanos e ex-dirigentes militares durante a gestão de Barack Obama. Ryan Crocker, ex-embaixador no Afeganistão, disse que a saída demonstrou uma "total falta de coordenação e planejamento pós-retirada". David Petraeus, ex-diretor da CIA, classificou a situação de catastrófica e um enorme revés para a segurança nacional. "Se você tivesse mantido o status quo, com 2.500 ou 3.500 militares em solo conduzindo operações contra o terrorismo, esta catástrofe não teria que acontecer", disse Liz Cheney, deputada republicana de Wyoming, à TV ABC.
No fim de semana, a imprensa americana destacou declarações de Biden, de semanas atrás, que mostravam contradições. Em julho, ele havia prometido que os EUA continuariam dando apoio ao governo afegão e disse acreditar que o Taleban não tomaria o poder à força, como ocorreu no domingo, pois os militares afegãos estariam bem treinados e equipados.
Pesquisas mostram que a maioria dos americanos, dos dois partidos, apoiam a saída dos EUA do país. No entanto, o presidente vem sendo criticado pela forma caótica como a saída vem ocorrendo, como as informações de inteligência do governo estavam erradas e por que seu governo prometia um cenário totalmente diferente do que ocorreu.
Estimava-se que as forças afegãs conseguiriam conter o avanço deles, ou ao menos resistir por alguns meses. Mas o governo local colapsou em semanas, a embaixada dos EUA em Cabul foi fechada às pressas e as cenas de afegãos tentando embarcar de qualquer jeito em aviões para deixar o país -inclusive tentando se agarrar à aeronaves em movimento- reforçam a imagem de que houve uma derrota americana.
Esta guerra, que começou em setembro de 2001, é a mais longa já disputada pelos EUA. Biden questionava há anos a presença americana no país. "Eu me oponho a ter forças permanentes no Afeganistão. Nenhuma nação jamais unificou o Afeganistão. Impérios foram lá e não fizeram isso", disse no mês passado .
A saída militar havia sido acordada pelo governo anterior, de Donald Trump. Em setembro de 2020, o republicano iniciou uma negociação com o Taleban, apontando para a retirada das tropas americanas do Afeganistão em 2021. Biden deu sequência às tratativas e, em 14 de abril, anunciou que colocaria fim à operação no Afeganistão até a simbólica data de 11 de setembro de 2021. Em seguida, antecipou o prazo para 31 de agosto, o que encorajou o Taleban a avançar rapidamente.
Um dia após o Taleban tomar o controle do Afeganistão, Joe Biden veio a público reafirmar sua decisão de retirar as tropas americanas do país e atribuiu a culpa do colapso do país no governo e nos militares afegãos.
"Os líderes do país fugiram. Isso comprovou que não devemos estar lá. Não devemos lutar e morrer em uma guerra que os afegãos não querem lutar. Demos a eles todas as chances que podíamos, mas não podíamos dar a vontade de lutar", declarou Biden, em discurso na Casa Branca, nesta segunda (16).
"Conversei com Ashraf Ghani [ex-presidente afegão]. Tivemos conversas francas. Avisei que o Afeganistão deveria estar pronto para lutar uma guerra civil, combater a corrupção e fazer negociações internas. Eles falharam em cumprir tudo isso", prosseguiu o democrata. Ghani deixou o poder no fim de semana e se refugiou no exterior. Ele disse que fez isso para evitar um banho de sangue no país.
Biden disse que, na situação atual, não haveria como manter a paz no país sem enviar mais soldados, o que levaria a uma terceira década de conflitos. "Quantas gerações mais teríamos de enviar para lá? Não vou repetir erros do passado, de lutar em guerras sem fim que não tem a ver com os interesses dos EUA. Mantenho minha decisão. Não haveria uma hora certa para retirar as tropas do Afeganistão."
O presidente repetiu que a missão dos EUA no país era capturar os terroristas por trás dos ataques de 11 de setembro de 2001 e evitar que grupos radicais usassem o Afeganistão como base, e que isso foi cumprido. Ele lamentou a situação atual, mas disse que a missão americana nunca teve como meta construir um país.
O democrata disse ainda que a missão agora é tirar os cidadãos americanos e aliados do Afeganistão, e que caso o Taleban tente atrapalhar isso, sofrerá represálias. Também lamentou as cenas vistas no país nos últimos dias e prometeu ajudar afegãos que ajudaram os EUA durante a ocupação militar a deixarem o país. "Muitos deles não saíram antes porque acreditavam que o país poderia se estabilizar", disse.
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