O julgamento que pode cassar o mandato de Sergio Moro (União Brasil-PR) e o inquérito aberto recentemente no STF (Supremo Tribunal Federal) podem consolidar em 2024 a cruzada de integrantes da política e de tribunais superiores contra o senador, além de enterrar de vez a Lava Jato.
O cenário de isolamento que Moro vive no mundo político e jurídico amplia o risco vivido neste ano pelo ex-ministro da gestão Jair Bolsonaro (PL).
Principal protagonista da operação que desvendou casos de corrupção em governos do PT e que foi em grande parte anulada por recorrer a manobras ilegais nas investigações, o ex-juiz deve ser julgado no começo deste ano pelo TRE-PR (Tribunal Regional Eleitoral do Paraná).
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Havia a expectativa de que o julgamento ocorresse ainda nesta semana, mas o processo ainda não foi pautado e pode ficar para fevereiro. O mandato de um dos juízes termina nesta terça (23), e o processo só pode ser analisado na corte com o colegiado completo.
A corte irá analisar uma ação que pode levá-lo à cassação e, mesmo se obtiver uma vitória no tribunal regional, há chance de o caso subir para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que tem uma formação ainda mais adversa ao ex-magistrado.
Os processos contra Moro tramitam em um contexto de isolamento do senador tanto no Legislativo quanto no Judiciário em Brasília.
No auge da popularidade da Lava Jato, os tribunais superiores referendavam praticamente todas suas decisões e a classe política temia fazer críticas à operação. Agora, o ambiente é o oposto, o que amplia a chance de o ex-juiz sofrer reveses nos processos a que responde.
Até o início de 2024, a ação eleitoral que conta com uma aliança inusual contra ele uniu o PT do presidente Lula e o PL de Bolsonaro era o principal motivo de preocupação do senador.
No entanto, em meados deste mês, ele passou a responder também a uma investigação criminal perante o Supremo. O ministro Dias Toffoli determinou abertura de inquérito para apurar a atuação de Moro no acordo de delação premiada do ex-deputado Tony Garcia firmado 20 anos atrás, em 2004, no âmbito do caso do Banestado.
O fato de Toffoli ser o relator do caso, aliás, amplia o risco vivido pelo ex-juiz. O magistrado do Supremo é um dos principais algozes da Lava Jato na cúpula do Judiciário.
Foi ele quem impôs uma das mais amplas derrotas à operação no ano passado, quando determinou que as provas oriundas dos acordos de leniência da Odebrecht e também dos sistemas Drousys e MyWebDay respectivamente de comunicação interna e de contabilidade e controle de pagamentos de vantagens indevidas são imprestáveis em qualquer âmbito ou grau de jurisdição.
Também foi o ministro que suspendeu a multa de R$ 10,3 bilhões imposta à J&F no acordo de leniência do grupo dos irmãos Joesley e Wesley Batista. E não só: na mesma decisão, o magistrado autorizou o grupo empresarial a ter acesso à íntegra das mensagens da Operação Spoofing, que possui conversas de integrantes da Lava Jato.
Agora está na mão do ministro um pedido similar, mas da Novonor (antiga Odebrecht). A empreiteira pediu a suspensão da multa de seu acordo de leniência e o acesso aos diálogos trocados em aplicativos de mensagem entre procuradores da Lava Jato entre si e com Moro, então responsável pela operação.
Desde que deixou a magistratura para se tornar ministro da Justiça de Bolsonaro no início de 2019, Moro passou a sofrer derrotas em série no STF.
A mais simbólica delas foi a anulação das condenações contra Lula quando era titular da 13ª Vara Federal de Curitiba. A decisão, além de criar um precedente que levou à derrubada de outras sentenças, também manteve o petista elegível novamente e viabilizou sua eleição à Presidência no último pleito, o que tornou o ambiente ainda mais hostil ao ex-juiz.
Como reação ao cerco que se fechava contra ele, Moro decidiu lançar uma candidatura à chefia do Executivo para enfrentar Lula e também Bolsonaro, de quem havia se tornado inimigo por ter afirmado que o ex-presidente tentou violar a autonomia da Polícia Federal para proteger sua família.
A dificuldade para formar alianças devido à restrição do mundo político a seu nome e de se tornar viável eleitoralmente o fez recuar. Moro preferiu concorrer ao Senado, inicialmente por São Paulo, mas a troca de seu domicílio eleitoral foi barrada. Optou então por seu estado natal, o Paraná, e venceu o pleito com 33% dos votos.
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Agora, o ex-juiz tem afirmado a interlocutores que pretende concorrer ao governo paranaense na próxima eleição, em uma sinalização de que não buscará a Presidência e de que não oferece risco aos projetos nacionais de poder em curso, numa tentativa de aliviar a pressão sobre sua situação perante a Justiça.
Assim como Moro, o ex-chefe da força tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol (Novo-PR), também ingressou para a política e se elegeu em 2022 o deputado federal paranaense mais votado.
Nem a expressiva votação, no entanto, foi suficiente para superar a animosidade de políticos e magistrados de Brasília com ele, o que é visto por atores políticos de Brasília como um prenúncio do que ocorrerá com Moro.
Embora não preenchesse exatamente os requisitos de inelegibilidade, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) fez uma interpretação expansiva da lei para cassar Deltan.
A legislação determina que integrantes do Ministério Público que pedem exoneração com PAD (processo administrativo disciplinar) pendente devem ser declarados inelegíveis. O ex-coordenador da Lava Jato, porém, não respondia a procedimentos dessa natureza quando se desligou da instituição, em 2021.
Os sete ministros da corte eleitoral, todavia, entenderam que Deltan tentou fraudar a lei pelo fato de ter deixado o Ministério Público Federal quando respondia a procedimentos que, mais tarde, poderiam se transformar em PAD.
No caso de Moro, a ação eleitoral movida por PT e PL o acusam de ter realizado gastos irregulares no período da pré-campanha. As ações traçam uma linha narrativa partindo desde sua filiação ao Podemos, em novembro de 2021, quando o hoje senador ainda mirava a disputa à Presidência.
Entre as principais frentes de gastos na mira da ação do PL estão a produção de vídeos e publicidade, pesquisas eleitorais, segurança privada, veículo blindado, consultoria jurídica, afirmando que a maioria deles teria sido realizada de forma disfarçada, como se fossem contratações para atividades partidárias, e não eleitorais.
Para o PL, o volume de despesas em benefício de Moro foi excessivo quando comparado ao teto de gastos da eleição ao Senado. Eles afirmam que desconsiderar esse fato abrirá "precedentes hediondos" para futuros pleitos.
"Sem a suficiente reprimenda do Judiciário, restará implícita a permissão para que qualquer partido político ou pretenso candidato promova um derrame de recursos e exponha desmedidamente um dos concorrentes para, no meio do jogo, converter a candidatura para outro cargo cujo limite de gastos seja inferior", diz a inicial.
As acusações do PT são similares. Agora, caberá ao TRE-PR decidir se ele deve ser cassado, o que levaria à realização de nova eleição para senador no Paraná, ou não.
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