Durante décadas, os medicamentos estimulantes usados no tratamento do TDAH foram vistos como aliados diretos da atenção e do foco. No entanto, uma nova pesquisa científica desafia essa ideia tradicional e propõe uma compreensão mais ampla sobre como esses remédios atuam no cérebro, trazendo impactos importantes para diagnósticos, tratamentos e para o debate sobre neurodivergência.
Por muitos anos, a medicina sustentou a teoria de que fármacos como Ritalina e Adderall atuavam diretamente nas regiões cerebrais responsáveis pelo controle da atenção, ajudando crianças e adultos com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) a se concentrarem melhor. Contudo, um estudo inovador conduzido pela Escola de Medicina da Universidade de Washington, em St. Louis, coloca essa explicação em xeque.
Publicado na revista científica Cell, o trabalho revela que esses medicamentos não influenciam de forma direta as redes neurais da atenção. Na prática, eles atuam principalmente nos sistemas de recompensa e de alerta do cérebro, alterando a forma como as tarefas são percebidas.
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Ao analisar exames de ressonância magnética funcional (fMRI) de quase 6 mil crianças, os pesquisadores observaram que os estimulantes deixam o cérebro em um estado constante de prontidão e motivação. Em vez de aprimorar o foco, os remédios tornam atividades repetitivas ou pouco interessantes mais atraentes e recompensadoras do ponto de vista químico.
Segundo o neurologista Nico Dosenbach, um dos autores do estudo, os estimulantes “pré-recompensam” o cérebro, permitindo que a pessoa mantenha o esforço em tarefas que normalmente não despertariam interesse, como aulas consideradas entediantes. Essa constatação ajuda a explicar por que crianças hiperativas conseguem ficar mais calmas: o medicamento reduz a necessidade de buscar estímulos externos, já que a atividade em curso passa a ser percebida como suficiente.
Outro ponto sensível levantado pela pesquisa envolve o sono. Os cientistas identificaram que os estimulantes mascaram, nos exames cerebrais, os efeitos da privação de sono. Um cérebro cansado sob efeito do medicamento pode parecer, nos testes, tão alerta quanto o de alguém bem descansado.
Isso acende um alerta para o diagnóstico do TDAH, já que a falta de sono pode provocar sintomas muito semelhantes, como irritabilidade, baixo rendimento escolar e dificuldade de concentração. Embora o medicamento possa melhorar temporariamente o desempenho de uma criança cansada, ele não corrige a causa do problema e pode contribuir para prejuízos associados à privação crônica de sono.
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Os autores reforçam que os estimulantes continuam sendo ferramentas eficazes, especialmente em casos mais graves. No entanto, defendem uma mudança na prática clínica: investigar a qualidade do sono deve ser tão essencial quanto avaliar a atenção antes de confirmar um diagnóstico. O estudo amplia o entendimento sobre o TDAH ao mostrar que motivação, descanso e regulação biológica desempenham um papel central no funcionamento cognitivo, indo além da ideia de uma simples falha no “centro da atenção” do cérebro.
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