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BELÉM 406A ANOS

Rua João Alfredo é considerada a vitrine comercial de Belém

A Conselheiro João Alfredo representa uma herança que advém do primeiro século da fundação de Belém, que é a ligação com a atividade comercial. Saiba mais sobre esta via da capital

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Com o decorrer dos anos, o processo de urbanização das cidades confere novos usos e novas características às ruas existentes, sobretudo as localizadas nas regiões centrais das cidades. Mesmo fincada no centro urbano de Belém, a Rua Conselheiro João Alfredo foge dessa regra. Ainda hoje, a conhecida rua da capital paraense representa uma herança que advém do primeiro século da fundação de Belém, a ligação com a atividade comercial que marcou a formação do segundo núcleo de ocupação da cidade.

Apesar do histórico ligado à atividade comercial que está desde o início do primeiro século da fundação de Belém, a Rua Conselheiro João Alfredo não deixou de acompanhar as transformações ocorridas, adotando diferentes perfis comerciais de acordo com o contexto social de cada época. É uma rua que, mesmo mantendo o mesmo caráter comercial, acompanha essas mudanças históricas da cidade.

Historiador e professor da Universidade do Estado do Pará (Uepa), Amilson Pinheiro explica que, para entender o contexto do surgimento da rua, é importante entender, também, o próprio crescimento urbano da cidade. Nas primeiras décadas do século XVII, logo após a fundação da cidade, as primeiras ruas abertas em Belém ficaram concentradas no que era chamado de Cidade, já que, à época, não havia uma divisão espacial por bairro.

Logo, naquele período, Belém se resumia a esse espaço que se concentrava no entorno do Forte do Presépio e que era ligado, sobretudo, à atividade militar, religiosa e política. “A partir de meados da segunda metade do século XVII começa a haver uma ampliação desse espaço de ocupação, que vai se chamar de Campina. Quando isso ocorre, ficam esses dois espaços, a Cidade e a Campina, que eram divididos pelo Igarapé do Piri, uma área alagadiça. Porém, a Campina já nasce com essa característica ligada à atividade comercial”.

Já no final do século XVII e início do século XVIII, a principal via que corta e atravessa essa segunda área de Belém é chamada de Rua dos Mercadores, que já mantinha essa característica comercial. A via ia de onde era o Igarapé do Piri até o Largo das Mercês, onde hoje é a Praça Visconde de Rio Branco. A tal Rua dos Mercadores, que era muito ligada a atividades comerciais e de abastecimento de produtos não só em Belém, como em outras regiões próximas, é o que se conhece hoje como Rua Conselheiro João Alfredo.

“Segundo o historiador Antônio Baena, a partir de 1727 esse espaço da Campina se torna uma freguesia, a Freguesia da Campina, e aí há uma dinâmica maior ainda dessa atividade comercial”, aponta Amilson Pinheiro. “Ao longo do século XVIII essa rua vai ser conhecida, também, como Rua da Cadeia porque, subindo em direção ao que hoje se chama de Rua Santo Antônio, havia um presídio da cidade. O terceiro nome que ela recebe é Conselheiro João Alfredo, que já é o nome atual”.

O historiador aponta que João Alfredo foi Presidente de Província do Pará no período entre 1869 e 1870. Apesar do pouco tempo, ele teve uma atuação importante e que acabou levando à atribuição do seu nome à rua que também tinha uma grande relevância no contexto urbano da cidade de Belém desde a sua formação.

“No século XIX, uma das principais fontes históricas que a gente tem sobre a urbanização e uma descrição da cidade de Belém é dos viajantes. Para cá vinham muitos viajantes, sobretudo europeus, e que acabaram deixando relatos de como era a cidade”, contextualiza o professor.

VIAJANTES

“No século XIX, um dos principais viajantes foi o Alfred Wallace que descreveu a Rua João Alfredo, então Rua dos Mercadores. Nessas descrições ele fala que Belém tinha uma estrutura urbana muito precária, com ruas estreitas, irregulares, casas baixas e muito simples, mas ele aponta que, dentro dessa estrutura urbana, a rua que se destacava era a Rua dos Mercadores porque ela tinha lojas maiores, calçamento. Então, ela já era uma rua que tinha um destaque no século XIX em relação às outras ruas de Belém”.

Uma das grandes mudanças sentidas pela antiga Rua dos Mercadores ocorre no final do século XIX e início do século XX, com a Belle Époque, período de ascensão da economia da borracha. À época, ocorre uma reforma urbana, um embelezamento, calçamento, todo um investimento em estrutura urbana que vai mudar um pouco a configuração da cidade.

O professor Amilson Pinheiro destaca que, nesse processo, também a Rua João Alfredo ganha um novo sentido e um novo significado. “Ela passa a ser um lugar das elites da cidade, então, era o lugar onde tinham as lojas de produtos importados, o lugar frequentado pelas elites, quase como uma passarela da moda, onde as pessoas marcavam encontro e iam não apenas para comprar. Era como um lugar de entretenimento e de passeio da cidade”, relata.

“Ela teve essa característica durante todas as primeiras décadas do século XX, inclusive, era um lugar bem sofisticado da elite de Belém até aproximadamente a década de 50 e 60, sempre marcada pela presença do comércio”.

VENDAS

- A rotina intensa e, muitas vezes, embalada pelo bom humor dos trabalhadores, é vivenciada pelo autônomo Wellinton Ribeiro da Silva desde os 18 anos . Hoje, com 39 anos, ele segue na atividade do comércio, sempre no mesmo ponto da Rua João Alfredo. “Eu comecei vendendo brinquedo, depois passei para bolsa, agora estou no jeans”, conta. “A João Alfredo é uma das referências mais importantes do Centro Comercial de Belém. A vida aqui é boa, é de onde muitos trabalhadores tiram o sustento”.

- Apesar da experiência mais recente em uma banca de roupas, a vendedora Aurilene Palheta de Lima, 37 anos, conhece bem a referência que a Rua João Alfredo representa para o comércio em Belém. “Eu estou trabalhando há dois meses aqui e antes disso eu nunca tinha trabalhado com comércio, mas eu sempre frequentei muito a João Alfredo como compradora”, recorda. “É uma das ruas do Comércio que eu mais conheço, aqui eu consigo resolver tudo que eu quero sem precisar andar muito”.

Diversificação do comércio e popularização da via

A partir da década de 60, 70 e início da década de 80 do século XX, a Rua João Alfredo sofre outra mudança. O professor aponta que a década de 70 para 80 é um período em que Belém passa por um contexto de migração grande, com a chegada de várias populações oriundas de outras áreas do Estado, sobretudo das cidades próximas da região do Baixo Tocantins.

“Essas pessoas passam a ocupar, também, bairros próximos à Cidade Velha. Nesse processo, muda, também, a própria característica da Rua João Alfredo porque ela acaba sendo impactada por esse processo de mudança demográfica, social e econômica da cidade e é quando ela ganha esse caráter popular”, explica o historiador.

“É a partir da década de 70 e de 80 que, de fato, ela começa a ser um lugar em que há uma diversificação maior do comércio na região. Antes, lojas mais sofisticadas e ligadas a um grupo mais restrito da sociedade e, a partir das décadas de 70 e 80, com as mudanças na cidade, esse comércio passa a ser diversificado, então, se observa a presença de óticas, sapatarias, lojas de eletrodomésticos e os mais diversos tipos de venda”.

Com essa diversificação do comércio, também se inicia o processo de popularização da Rua João Alfredo. Outras classes sociais, e não mais majoritariamente a elite, também começam a frequentar a rua e suas lojas. “Também em função dessas mudanças demográficas, começa a aparecer uma das principais características da rua hoje, que é a presença dos ambulantes, dos camelôs, dos trabalhadores informais”.

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